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SENADORA APRESENTA PROJETO QUE MODIFICA PUNIÇÕES PELO CFM
Projeto da senadora Maria do Carmo Alves, do DEM de Sergipe, define novas gradações de penas disciplinares aplicados pelos Conselhos de Medicina aos seus profissionais. Segundo ela, a atual lei precisa ser revista por que apresenta uma gradação imperfeita entre a pena de suspensão - que prevê um máximo de 30 dias até a pena máxima, que vem logo em seguida, que determina o cassação definitiva do registro profissional, uma "pena de morte para o médico", segundo ela.
A proposta da senadora baseia-se em sugestão da Dra.Deborah Pimentel, em artigo intitulado "Infelicitas facti: erros médicos e punições", publicado ano passado no CINFORM e na revista da Sociedade Médica de Sergipe. Leia na íntegra:
Infelicitas facti: erros médicos e punições.
Os médicos são membros da categoria profissional que mais se preocupa com a ética. No ano 2.400 a.C., o Código de Hamurabi já legislava sobre a prática médica e no ano 460 a.C. Hipócrates defendia os preceitos da ética e nos presenteou com o seu juramento, usado, até hoje, em solenidades de graduação das escolas de Medicina. O Conselho Federal de Medicina - CFM - foi criado pelo presidente Juscelino Kubitscheck em 1957, a pedido dos médicos, com o propósito de se ter um órgão fiscalizador das práticas médicas, julgando-os com isenção diante de infrações do Código de Ética Médica.
Desde então, a profissão hipocrática se constitui no segmento mais regulamentado. Em menos de três décadas foram produzidos três códigos de conduta médica - 1965, 1984 e 1988. O exercício da Medicina está contemplado em 22 estatutos legais e em 214 artigos, desde a Carta Magna até à Resolução do CFM nº 1246/88 que aprovou o estatuto em vigor. O segundo artigo do nosso Código de Ética Médica resume a nossa missão e diz que “o alvo de toda a atenção do médico é a saúde do ser humano, em benefício da qual deverá agir com o máximo de zelo e o melhor de sua capacidade profissional”.
No artigo 29 do capítulo III do mesmo Código, que trata da responsabilidade profissional, encontramos descritas as razões que geram a maioria das punições sofridas pelos médicos: “é vedado ao médico praticar atos profissionais danosos ao paciente que possam ser caracterizados como imperícia, imprudência ou negligência”. A imprudência é uma prática intempestiva, precipitada ou insensata, a negligência se caracteriza pela inércia, passividade e falta de zelo. A imperícia se dá por falta de conhecimento da técnica ou das recomendações que a envolve. O Conselho, que é um órgão fiscalizador, pode iniciar um processo ético profissional a partir de uma denúncia formulada por um conselheiro, pelo próprio doente ou familiar responsável, por um colega ou ainda pela Comissão de Ética Médica da instituição que o médico denunciado atua.
Uma questão que sempre se houve falar é que o CFM nunca pune os médicos infratores com o rigor necessário e que os processos são engavetados. As coisas não são exatamente como dizem ou parecem e o número de médicos punidos, em todo o país, aumenta a cada ano. Após a denúncia formalizada, será aberto, inicialmente, uma sindicância para apurá-la. Esta denúncia não pode ser anônima e para que ela resulte em um processo ético-profissional deve ser verificado se existem elementos suficientes que a justifiquem, o que significa, no mínimo, o estabelecimento de uma relação nexo causal. O problema é que nem sempre estas premissas satisfazem, até por que muitas denúncias são motivadas pelo mau relacionamento entre o médico e o paciente ou seus familiares.
Uma vez aberto o processo ético-profissional, conforme a gravidade do erro médico as condenações variam, de acordo com o artigo 22 da Lei nº 3.268/57, em: advertência confidencial, censura confidencial, censura pública, suspensão até 30 dias e cassação do diploma médico. Importante ressaltar as distorsões das penas previstas desde 1957, no Código de Ética Médica, pois há um fosso gigante entre uma suspensão de 30 dias e a cassação definitiva do diploma médico. Em um conselho similar ao nosso, o da Ordem dos Advogados do Brasil, por exemplo, existem penas intermediárias entre esses dois extremos.
É hora dos parlamentares atentarem a esta questão e criar um novo dispositivo legal atualizando uma lei de 50 anos. Muitos estudiosos do Direito comparam a cassação que um médico pode sofrer, à pena de morte ou a prisão perpétua, inexistentes no Brasil. Edmilson de Almeida Barros Júnior, médico, advogado e Mestre em Direito alerta ser “...irrefutável a inconstitucionalidade da pena de cassação do exercício profissional do médico, posto que este, uma vez cassado, está impossibilitado de ser reabilitado conforme o Código de Processo Ético-disciplinar específico sendo, portanto, sua pena de cassação de natureza perpétua, o que é vedado pela Constituição Federal”.
As vítimas de erro médico podem buscar outras formas de punição, no âmbito da justiça, baseada na responsabilidade penal ou cívil. Mas estes processos são desvinculados daquele no CFM. Todo profissional, inclusive o médico, é passível aos erros e às consequentes e justas sanções da lei e do seu órgão regulamentador, mas é desejável prudência na aplicação de medidas punitivas, permitindo ao acusado a faculdade do contraditório e o amplo direito de defesa.
Podemos nos perguntar quais as razões do erro médico, e elas não são difíceis de serem explicadas, haja vista a natureza da sua prática ser complexa e por serem inúmeras as intervenções que cada paciente recebe. Não se pode, tampouco, se distanciar da cultura médica onde o erro é inaceitável e, quando ocorre, é percebido invariavelmente como se houvesse uma falha de caráter do médico colocando-o numa posição de culpa irremediável, ou seja, os médicos foram treinados para uma prática profissional livre de erros. Tanto a população, que é implacável com os médicos, quanto ele próprio, não admitem que errar é inerente à espécie humana, alçando o profissional a um lugar impossível e quase divino, o da infalibilidade.
